O termo baldio (possivelmente do árabe “balda” ou “batil”, inútil, sem valor ou vago; ou do latim “evalidus”, terra não lavrada e não coutada), surge em Portugal no século XIV (Chancelaria de D. João I), importado de Castela. Na legislação, ocorre já nas Ordenações Manuelinas, Lº V, tt. 83. O termo divulga-se lentamente, sendo apenas após 1744 que passa a figurar frequentemente na legislação. Os baldios designavam quer terras não cultivadas, no sentido genérico de maninhos, quer incultos de uso comunal, i.e., logradouros do concelho, para aproveitamento comum de águas, ervas, lenhas e madeira e espaços de transumância. Nesta acepção, correspondem aos “publicis pascuis quos appellant (Baldios)” ou aos “agris communibus (quos dicimus Baldios)” mencionados por Valasco no final do século XVI, distinguindo-os dos incultos a dar em sesmaria “quos (maninhos) vulgo apellamus”, (Iuris Emphyt, t. II, p. I, q. 8, n. 39 e 43). De acordo com as Ordenações, as terras nunca cultivadas dos termos dos concelhos passaram com o foral aos seus moradores, para os seus logramentos, dando-se as restantes em sesmaria. Ao afirmar-se o direito dos moradores aos baldios concelhios, interditava-se qualquer ingerência régia, dos donatários da coroa ou de outros particulares. As reclamações das câmaras e as disputas judiciais revelam uma prática abusiva recorrente. No século XVII, os juristas afirmam o direito dos moradores aos baldios por lhes terem sido doados pelos forais. Dada a natureza dos incultos, bens vagos de direito real, doa-se um direito e não o domínio directo, reservando-os os concelhos em razão da utilidade comum, mas detendo apenas o domínio útil comum. Aos donatários concede-se o direito a dar em sesmaria (não em enfiteuse porque não detêm o domínio directo) aqueles maninhos que o concelho não reservou para baldios. Apenas a concessão por presúria, (nas terras ermas ou quase ermas, doadas após conquista, pelos forais dos primeiros reis), incluía os incultos, sendo os baldios dos senhores. Não havendo uma ruptura com a bipartição bartolina entre domínio directo e útil, debate-se o direito incorpóreo aos bens vagos, concretizado no direito de sesmaria e/ou domínio útil dos espaços comunitários. Contudo, a par da afirmação dos conceitos modernos de dominium, a prática consolida-se de forma diversa: com excepção do Brasil, as sesmarias, como direito a um bem vago, perdem sentido, e os incultos (agora maninhos, se senhoriais, ou baldios, se concelhios) são geridos como bens próprios através de contratos enfitêuticos. Na verdade, nos concelhos régios, os executivos camarários exercem um crescente domínio sobre os baldios, tomando-os sob a sua alçada, regulamentando-os, vigiando-os e impondo coimas. No século XVI, os baldios são geridos como um bem concelhio. Em ilhas açorianas, na Madeira e no Reino, grande parte dos baldios concelhios são arrendados durante os séculos XVI e XVII. O poder central regula o aforamento das terras concelhias, mas não as diferencia dos baldios. Na documentação pombalina e mariana estes eram assumidos como um bem próprio concelhio. No século XVIII, Pereira e Sousa relembra que os baldios são da coroa quanto à propriedade, e são dos povos do termo quanto ao uso, pertencendo às câmaras a sua administração. Os memorialistas dessa época dedicam vários estudos aos baldios, afirmando Vila Nova Portugal que eles estavam no domínio comum dos moradores – cedidos para cultivar em sesmaria – distinguindo-os dos bens dos concelhos. Mas, nesse momento, o que está em causa é a afirmação da propriedade individual, como direito absoluto, pleno e privado, estando aberto o caminho para a desamortização dos baldios. [A: Teresa Rebelo da Silva, 2014]
Bibliografia: Castro 1963; Hespanha 1980; Neto 2010; Portugal 1991 [1790]; Sousa 1825; Valasco 1590; Viana 2007.
doi:10.15847/cehc.edittip.2014v035