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Maranhão (Estado)
Criado em 1621, na porção setentrional das possessões portuguesas na América, o Estado do Maranhão se manteve unidade administrativa independente até princípios do século XIX, característica que se consolidou com a criação do bispado do Maranhão (1676) e depois do bispado do Pará (1719), ambos sufragâneos do patriarcado de Lisboa. Ao longo do período colonial o Estado do Maranhão teve inúmeras configurações territoriais e diversas denominações. Da sua fundação até meados do século XVII, incorporava as capitanias reais do Maranhão, Pará, Gurupá e Ceará, além de capitanias privadas (Cumã ou Tapuitapera, Caeté, Cametá e Cabo do Norte). Em 1656, dele se desvinculou a capitania do Ceará. De meados do século XVII até princípios do século XVIII, se incorporou a capitania régia do Piauí, se criou a capitania privada na Ilha Grande de Joanes (Marajó) e a coroa incorporou a capitania do Cabo do Norte. Até meados do século XVIII se manteve como Estado do Maranhão ou Estado do Maranhão e Pará (ou Grão-Pará). A partir da administração pombalina, passou-se a denominar Estado do Grão-Pará e Maranhão, se criou uma nova capitania régia, São José do Rio Negro, e as capitanias de donatários foram incorporadas pela coroa. Em meados dos anos 1770, surgem duas unidades separadas, o Estado do Grão-Pará e Rio Negro e o Estado do Maranhão e Piauí. O Piauí permanece unido ao Maranhão até princípios da década de 1810. A fundação do Estado do Maranhão tem que ser entendida no contexto da união das coroas ibéricas, ainda mais pelo fato de situar-se geograficamente no meio das possessões portuguesas e espanholas da América do sul. Um dos principais argumentos que levou à criação do Estado do Maranhão foram as cada vez mais claras dificuldades de navegação entre a costa brasileira e as possessões setentrionais, definidas pela tomada da cidade de São Luís do Maranhão aos franceses, em 1615, e pela fundação da cidade de Belém do Pará, em 1616; inclusive, até o século XIX, era mais fácil navegar de São Luís e Belém a Lisboa do que às cidades e vilas da costa brasileira. Por outro lado, a fundação do Estado do Maranhão se articula à tentativa da monarquia dual de incrementar a defesa de suas possessões do assédio principalmente das Províncias Unidas. Assim, a conquista e colonização da região, nas primeiras quatro décadas do século XVII, são marcadas pelos embates contra outras nações europeias, como holandeses, franceses e ingleses, além de conflitos com diversos grupos indígenas da região.
A extensão do Estado do Maranhão revela a sua heterogeneidade ambiental e a diversidade da ocupação de seu território. Assim, do ponto de vista econômico, podemos definir algumas regiões que mantiveram certa homogeneidade ao longo do tempo, marcadas pela exploração das drogas do sertão (a oeste), por uma economia agrícola de policultura (nos rios próximos a Belém e na Ilha de São Luís, que a partir de meados do século XVIII a coroa procurou tornar mais eficiente, por meio do incentivo ao cultivo de produtos exportáveis, como o arroz), de criação de gado (no arquipélago do Marajó e na porção mais oriental do Estado, na fronteira das capitanias do Maranhão e do Piauí) e pela produção de algodão e arroz em finais do século XVIII e princípio do século XIX (ao sul da capitania do Maranhão). Onipresente em toda a região amazônica (correspondente à porção central e ocidental do Estado do Maranhão) foi o cultivo da mandioca (Manihot utilissima) e seus inúmeros usos, notadamente como farinha. Se a coleta das drogas, as expedições ao sertão, a criação de gado e o plantio de cacau e açúcar, e mais tarde de algodão e arroz, dominaram as atividades econômicas do vasto Estado do Maranhão, a farinha foi essencial a todas elas, pois constituiu a base da alimentação da heterogênea população colonial, tornando-se, inclusive, moeda para pagamento das tropas. A influência indígena é aqui fundamental, muito embora a referência à mandioca, ao seu cultivo e seu processamento como farinha dificilmente apareça de maneira explícita, por exemplo, nas doações de terras.
Grande parte da ocupação do Estado do Maranhão seguiu os cursos dos rios, por meio dos quais se definia principalmente a distribuição de terras em sesmaria. Assim, notadamente na parte propriamente amazônica, o que poderíamos denominar de “fluvialidade” marca decisivamente (em alguns lugares até hoje) o sentido da presença europeia na região, já que as comunicações e o transporte se fazia notadamente pelos rios (principalmente nas capitanias do Pará e do Maranhão). Essa “fluvialidade”, por outro lado, revela a importância das populações indígenas para entender os sentidos da ocupação do espaço. Isso fica claro na própria toponímia que se mantém até hoje. Excetuando-se o grande rio Amazonas e alguns outros menores, a influência da toponímia nativa dos rios revela a marca da presença dos grupos indígenas e da inevitável relação que os portugueses tiveram que estabelecer com eles para manter o seu domínio, ainda que fragmentado, sobre esse imenso território.
Em relação à ocupação agrícola e pastoril, que tomou principalmente as regiões centrais e orientais do Estado do Maranhão, no que diz respeito à distribuição de terras em sesmaria, diferentemente do que ocorreu no Estado do Brasil, houve uma centralização dessa faculdade na mãos dos governadores do Estado, mesmo quando se tratava de distribuição de terras em capitanias de donatários. Assim, praticamente não há registro de terras concedidas por outras autoridades, o que significou uma utilização da concessão de datas por parte das autoridades régias não só como instrumento político, mas igualmente como forma de ordenar a própria ocupação econômica do território. Exemplar nesse sentido é a expansão pelos rios dos limites entre as capitanias do Maranhão e do Piauí. À realização de guerras contra os índios, comandadas principalmente pelos governadores, nas duas primeiras décadas do século XVIII, seguiu-se uma considerável distribuição de terras a moradores que já estavam na região ou vinham de São Luís (por volta de 290 datas, entre 1723 e 1732, concedidas em dois governos). Esse movimento permitiu a consolidação do povoamento da região, por meio da eliminação ou pacificação dos grupos indígenas e da legitimação da posse dos moradores da região oriental do Estado do Maranhão. [A: Rafael Chambouleyron, 2014]
Bibliografia: Acevedo Marin 2000; Cardoso 2012; Chambouleyron & Melo 2013; Cruz 2011; Marques 1870; Mota 2012; Mott 1985; Reis 1993 [1940].
doi:10.15847/cehc.edittip.2014v027