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Diretório dos Índios

Promulgado em 1757 com base em uma sequência de leis e alvarás datados de 1755, o Diretório representou um esforço na regulamentação da política indigenista no Brasil. Inicialmente destinava-se apenas ao Maranhão, sendo estendida a sua aplicação ao Estado do Brasil a partir de 1758. Apresentava adaptações e alterações de legislação anterior, como o Regimento das Missões (1686), buscando suprir falhas e padronizar ações. Mais do que um conjunto de medidas, é um marco de mudança ideológica na colonização portuguesa. Tinha como característica fundamental a preocupação em trazer para a coroa a responsabilidade sobre a administração dos aldeamentos indígenas, repensando o papel central dos jesuítas na “civilização”, visto que os religiosos assumiam controle espiritual, político e econômico sobre os aldeamentos e seus indivíduos. As novas premissas eram contrárias ao isolamento dos indivíduos em aldeamentos, estimulando casamentos entre indígenas e colonos. Determinava o português como idioma oficial nos aldeamentos, além da adoção de nomes e sobrenomes portugueses. Todos passavam também a ser reconhecidos como vassalos da coroa portuguesa. Com a expulsão dos jesuítas, a administração dos aldeamentos ficou sob a responsabilidade de diretores, auxiliados por padres nas questões de educação e catequese. Diretores e padres passaram a representar duas esferas distintas de poder no interior dos aldeamentos. Práticas de ritos religiosos indígenas foram condenadas, despindo-os de sua bagagem cultural anterior ao contato com os europeus, e vestindo com novos valores, tipicamente portugueses, com os quais se construía a sociedade colonial. O Diretório proibia a escravidão indígena, salvo em casos de guerra justa, determinando a remuneração dos serviços realizados pelos índios. Índios descidos e reunidos eram divididos em dois grupos – retidos e alugados. Os primeiros eram utilizados nas roças comuns do aldeamento e na coleta de drogas do sertão, sob administração real. Os demais seriam destinados ao trabalho junto a particulares, na agricultura comercial e, mais uma vez, na coleta de drogas do sertão. A lei fundava-se na importância do trabalho para organizar os grupos e viabilizar sua “civilização”, legitimando o uso da mão-de-obra indígena. Nos anos anteriores ao Diretório, a coroa muitas vezes se viu diante de impasses com relação à política indigenista, dividindo-se entre os interesses dos fazendeiros e os dos padres, cultivando alianças com ambos. Com o Diretório, o governo assumia posição favorável aos colonos, reconhecendo o trabalho como caminho para a “civilização”.

O Diretório representou também uma estratégia no processo de consolidação dos limites territoriais. Ao reconhecer os indígenas como vassalos portugueses, garantia que as terras ocupadas ao norte, em disputa com os espanhóis, pudessem ser justificadas como terras ocupadas por vassalos do rei português. A redução das responsabilidades dos religiosos poderia refletir uma ruptura para os colonizadores, mas não para os indígenas, dada a manutenção do diretor responsável, sustentando a política desenvolvida. Autores que analisam criticamente a lei ressaltam também a exploração do trabalho indígena, afirmando que a preocupação voltava-se para a criação de uma reserva de mão-de-obra barata nos aldeamentos, da qual os colonos poderiam dispor. Na prática, o Diretório revelou dificuldades na aplicação e foi abolido em 1798. Seu sucesso, no entanto, está em suas repercussões, visto que norteou a política indigenista posterior. [A: Marina M. Machado, 2014]

Bibliografia: Almeida 1997; Domingues 2000; Sampaio 2011.

doi:10.15847/cehc.edittip.2014v041

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