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Branco da terra

O primeiro traço da ambivalência identitária, presente no designativo eufemístico “brancos da terra”, poderá ter surgido ainda em meados do século XVII, visando os membros da elite endógena cabo-verdiana, denominados dessa forma apesar de serem na sua maioria “pardos e pretos”. Em Santiago, nos séculos XVII e XVIII, não indicava a cor da pele mas a posição social, ser-se honrado, proprietário de terras e de escravos, com rendas provenientes da exploração agrícola, elegível para a câmara e mesa da Misericórdia, pertença às elites locais; em S. Tomé e Príncipe conferia elegibilidade também para o cabido catedralício. Era a necessidade crescente de branquear origens crioulas, mestiças e mulatice para provisão de cargos e ofícios. Na Bahia, os brancos da terra, mestiços e “morenos”, podiam ser tão escuros quanto os seus escravos negros. Em carta enviada ao rei, o ouvidor José da Costa Ribeiro (16.04.1731) notou que os “brancos” da terra “propriamente sejam mulatos, e muitos pretos”. Em Angola, configuraria a visão do vulgo e estratégias de afirmação social de parentelas “pardas”. Em Moçambique, a miscigenação originara uma elite mestiça, assim designada, tanto pelos negros quanto pelos europeus. Ali, antes de 1890, surgiam nos recenseamentos como brancos, mas, a partir de uma portaria provincial de 1917, aparecem como pertencentes à raça negra. Nos contextos aludidos, a designação “branco” raramente teria um carácter fenotípico, antes social e económico, enquanto atributo de pertença a um grupo social, em função da partilha de um conjunto de características reais ou imaginadas, pelo que não comportaria uma dimensão exclusiva ou maioritariamente racial. [A: João Figueirôa-Rêgo, 2015]

Bibliografia: Cabaço 2001: 351-408; Cabral 2002; Figueirôa-Rêgo e Olival 2011; Oliveira 2013; Soares 2013.
doi: 10.15847/cehc.edittip.2015v035

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